É bem possível
que você nem saiba meu nome, muito menos outras coisas sobre mim. Sou aquele
completo estranho que a gente vê de vez em quando. Eu, no entanto, já sei muito
da tua rotina, sei bem os teus traços – caso precise descrevê-los, sou a pessoa
mais indicada. O teu nome, não foi bem a primeira coisa que eu soube sobre
você, aliás, veio muito depois das primeiras palavras trocadas e muitas unhas
roídas de curiosidade querendo saber tudo sobre quem vi algumas vezes. Antes
disso eu já soube: queria saber muito mais. Espero ter passado despercebida
todas as vezes que vigiava a tua janela antes mesmo da minha ao chegar em casa,
ou quando olhava para os vários lados na esperança de te ver ali no meio do
caminho, trocar um “bom dia” casual enquanto meu coração triplicava o movimento
de suas baquetas. Eu realmente não consigo entender, e não espero que os outros
entendam, como alguém que mal conhecemos pode causar tão dramático efeito em
como vivemos. Posso parecer apenas mais um rosto no mosaico dos tantos que você
vê por aí, mas para mim o seu representa mais do que qualquer um, sem nem mesmo
ter motivo especial para tal. A tua figura, sem particularidades, é singular.
Enquanto, pra você, meu nome é Estranha, eu já te dei muitos nomes além daquele
que você conhece. São nomes que eu chamo quando estou só, imaginando que estás
bem ali a alguns passos de mim. Sem saber bem ao certo os detalhes da tua vida,
conheço os horários em que posso ouvir tua voz ao longe conversando com seus amigos
enquanto sai de casa para o trabalho ou algo do tipo. Sei quando posso,
propositalmente fazer a coincidência de te encontrar chegando em casa ao mesmo
tempo que eu, parecendo surpresa por te encontrar ali, dizendo “boa tarde” mas
querendo saber como vai, por onde tem andado e quais seus mais íntimos
pensamentos agora, mas ao mesmo tempo suando, querendo correr e ficar. Não sei
se você me acha uma pessoa de poucas palavras, pois tudo que falamos um pro
outro são saudações convencionais, mas a verdade é que eu tenho todo um texto
em mente que eu construo nas horas em que deveria estar pensando em qualquer
outra coisa, mas as palavras se perdem antes mesmo de surgirem. Eu pouco sei da
tua personalidade – além daquela que criei pra você, é claro – mas imagino que
não conheço uma das melhores pessoas que poderia conhecer. São poucos, e você
aí está, aqueles cuja ausência me perturba. Fico imaginando mil coisas quando
te vejo e outras milhões quando você some. Quando você aparece novamente, toda
essa ansiedade vai e dá lugar a outra, velha conhecida, querendo e não querendo
te ver. Torço pra que você esteja no meu caminho e rezo para que nem te veja
quando acho que não estou apresentável.
Quando você sai ou chega fico querendo saber quais são seus descaminhos
e querendo me perder neles com você. O tempo que deveria dedicar às outras mil
coisas que estavam na minha vida antes de você é, hoje, todo seu. As palavras
que deveria estar agora dizendo a você, enquanto nos encontramos casualmente
como nas outras muitas vezes, depois do oi e do sorriso tímido, estou
derramando agora sobre esse papel. E esse papel, que eu poderia te entregar em
mãos na mais remota possibilidade, é mais provável de acabar amassado na
lixeira. As nossas conversas que já aconteceram tanto na minha cabeça, talvez
nem aconteçam. Enquanto a coragem se perde no meio do caminho, vou tentando
encontrá-la mesmo assim e espero que nesse meio tempo possa te encontrar muitas
outras vezes.
(15/04/15)
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