Uma visita a uma instituição de longa permanência para idosos na cidade de Juazeiro do Norte - CE, como atividade da disciplina de Gerontologia, reacendeu questões existencialistas que já havia me feito anteriormente. Versar sobre o tempo e a vida e o que nos espera à frente é algo difícil, principalmente pela incerteza que já vem atrelada por conceito. Esse texto vem de um evento chave, mas que traz algo também de bagagem.
Interrogações de um vivente
Rodeado por
muitos - uns tão jovens, outros nem tantos, uns com espírito de quem vive a
tenra idade - estive a pensar no que o tempo nos reserva. De repente, ouço: “percebi
que tenho mais passado do que futuro”. Aquilo insistindo em me perturbar, como
martelo incansável. As muitas indagações que me fiz e cujas respostas não pude
dar ainda perduram no celeiro mental. Fiz-me imaginar a sensação do ter vivido
anos incontáveis, atravessado gerações e não se dar conta do quanto foi
perdido, ou deixado de ganhar, de ter colecionado calos que a vida nos dá,
observando se foi satisfatória a colheita. Será, essa sensação, similar a esta
com que venho convivendo? Questiono inclusive a legitimidade desse sentimento. Explico-me:
Estar próximo da linha de partida, na maratona vital, faz-nos crer que o futuro
é algo longínquo e que os planos podem ser postergados com segurança. Pelo menos
à maioria. Porém, a vida é algo que nos apresenta as mais variadas situações,
usualmente sem aviso prévio. Que a vida é uma caixinha de surpresas, já ouvimos
muito – e não poderíamos nos deparar com maior verdade. E, assim sendo, será
correto esse comum pensar de que aos jovens o tempo é mais generoso e as
adversidades da vida, menos tangíveis? Indo além: há mesmo permissividade a
esse ócio vital, em que o que não foi feito um dia será? Os feitos, mal feitos
ou perfeitos, parecem às vezes algo que nos será entregue pelo tempo, pela
vida. Só posso julgar como grande equívoco: os feitos, como a palavra dá a entender,
resultam de uma ação. Minha inquietação resulta da sensação de, embora com
pouca história a contar, o semeado não me parece suficiente, o tempo não me
parece relativamente generoso e a vida, esta, me parece nada previsível. Tento
diariamente aprender a lição de não perder tempo com o que não o vale,
exaurir-me no que posso me sentir feliz e não no que são incertos os
resultados. Entram em conflito o sentimento pueril das aventuras, os riscos, as
apostas, aproveitar ao máximo tudo que se pode ser oferecido, contra o peso da
senilidade espiritual, se me permitem assim chamar esse medo das incertezas e
aversão à inutilidade.
Estar no meio
da travessia é mais do que ansiar pela chegada: é sentir saudade dos sorrisos
deixados pra trás, lembrar dos passos já dados, arrepender-se dos erros no
trajeto. É ainda querer aproveitar ao máximo toda a paisagem que se apresenta
nesse caminho.
O tempo nos
transporta do que fomos ao que seremos e parece-me, na verdade, que isso
acontece continuamente e que, apesar das aparências, não difere em tratamento
aos muitos passageiros. A travessia se dá sempre e o nosso plantio nunca cessa.
A colheita não tem data marcada. É preciso regar sempre, escolher as melhores
sementes. Mas vale lembrar que o erro é possível e não é imperdoável. Arriscar
faz parte desse trabalho: no terreno, no local, nos frutos. Lembrar devemos: o
plantio nunca cessa, a caminhada é contínua. As paradas servem para contemplar
o meio, mas com a perspectiva do que está por vir. Se os frutos serão bonitos,
se ao final haverá uma triunfante linha de chegada, não sabemos. É esse
mistério que nos impulsiona.
(01/11/2014)